O livro “E Terás Que Me Dizer” é uma investigação interior levada a cabo pelo psiquiatra brasileiro Jorge Cunha Cruvinel Filho. Após se dedicar por anos ao autoconhecimento, o autor expressa suas vivências nesse campo de maneira livre e poética. O autor busca compreender a consciência humana à luz da sabedoria não-dual (Advaita Vedanta), explorando os movimentos mentais a partir de seus fundamentos (gunas): as energias de sattva (energia luminosa), rajas (energia de vida) e tamas (energia de morte). As transformações interiores ao longo do caminho espiritual são o foco do livro. De facto, o despertar (moksha) é uma ocorrência interior que desabrocha em um instante revelador, contudo as vivências interiores ao longo dos anos de busca por compreensão são muito pouco exploradas pela literatura espiritual. O livro tenta contribuir para preencher essa lacuna, sem nunca desconsiderar a peculiaridade do processo vivenciado por cada um. Eis a canção espiritual de um buscador sincero.
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E TERÁS QUE ME DIZER
€14.00
Informação adicional
Peso | 220 g |
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ISBN | 978-989-8994-29-5 |
Ano | 2021 |
Edição | 1 |
Idioma | |
Formato | 145X210 |
Encadernação | Cartonada |
N. Pág. | 136 |
Colecção |
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Capítulo 34:
92. Duas tendências se apresentam comumente à consciência humana. A tendência de rajas (energia de vida) vislumbra uma perfeição na vida humana e busca encontrar segurança no mundo. Como se pudesse, através do esforço mental, resolver todas as questões e tornar tudo equilibrado. Essa energia faz se deslumbrar com o mundo e buscar objectivos mundanos torna-se demasiado importante. A partir disso, a mente humana fica energizada e busca uma espécie de perfeição em todas as áreas da vida: do conhecimento, do trabalho, das relações humanas, da estética, da religiosidade e assim por diante. Igualmente, busca encontrar condições no mundo que lhe dêem segurança física e psicológica. Contudo, a segurança no mundo instável sempre se revela impossível e a busca por perfeição é sempre causa de grande frustração. Esperar por resultados dos esforços que empreendemos no mundo é uma forte característica de rajas, que pode nos deixar demasiadamente envolvidos com o mundo e, assim, inquietos e ansiosos. Por outro lado, se agimos de maneira simples e despretensiosa, nossas acções tornam- -se mais equilibradas (sáttvicas) e, com a mente mais subtil, conseguimos captar os influxos divinos no fundo da nossa consciência e, desse modo, tomar melhores caminhos. Além disso, rajas é uma energia mental que causa um movimento excessivo, deixando-nos agitados e levando a esforços descomunais. Gera um imenso apego às coisas do mundo e um consequente esquecimento da Verdade. Então, a mente emenda um pensamento no outro e nunca descansa, tentando resolver problemas mundanos, problemas psicológicos, problemas das pessoas afectivamente próximas e também problemas ditos espirituais. O fluxo torna-se tão intenso que, mesmo quando dormimos e sonhamos, continuamos no afã de resolver os problemas criados pela própria mente. Assim, a consciência humana fica perdida em suas questões psicológicas e não percebe a vida com clareza, sempre projectando a balbúrdia mental no mundo e nas suas relações interpessoais. Torna-se extremamente difícil conectar-se com os outros e até mesmo com a vida. Quando rajas é demasiado, pode desencadear um senso de competitividade. Na sanha por objectivos mundanos, a mente humana olvida a Unidade da vida e começa a enxergar os outros como inimigos. Assim, embora a mente seja reflexo da Consciência Divina, ela pode realizar coisas tão asquerosas como guerras e genocídios. A outra tendência habitual da mente humana é tamas (energia de morte). Totalmente ciente das limitações da vida no mundo (tendendo, inclusive, a exagerá-las), essa energia anula os impulsos de buscar uma pretensa perfeição. Pelo contrário, conduz a uma indolência e à desesperança. Assim, leva a uma espécie de fuga da realidade através de atitudes e pensamentos sem sentido, que podem gerar danos e, consequentemente, mais desesperança num círculo vicioso. É quando se apela para vícios e acções estúpidas. Nessa postura não se tenta construir nada, mas, pelo contrário, destruir aquilo que foi construído. Tendo vivenciado algum sofrimento intenso ou forte frustração, a mente humana pode ficar presa nessas experiências do passado. Então, enche-se de tamas e projecta o passado sombrio nas vivências do presente, limitando a si mesma cada vez mais. O temor é a tónica de tamas e, assim, não é possível relacionar-se com a vida de forma sã. Essa energia coloca-nos numa postura defensiva e rompe a nossa conexão com a vida ao interpretá-la erroneamente como uma fonte inesgotável de sofrimento. A angústia toma conta e, para nos distrairmos dela, tomamos os caminhos mais espúrios, uma vez que, nesse estado, nada de produtivo pode ocorrer. O aquietamento nesses momentos e o distanciamento dessa energia são indícios de algum despertar espiritual. Nem sempre é possível desvincular-se por completo dessa energia, principalmente quando dificuldades intensas sobrevêm, mas o facto de essa energia ir perdendo a capacidade de nos dominar e ir se tornando menos frequente é muito auspicioso. Uma mente poluída pelo excesso de tamas não consegue acreditar na boa nova que a sabedoria espiritual nos apresenta, pelo contrário, tudo lhe parecerá caótico e a vida será encarada como uma reles sucessão de acasos. Ambas as tendências habituais mencionadas (rajas e tamas) podem ser muito prejudiciais quando excessivas. A mente humana pode desenvolver a capacidade de reconhecê-las e, na medida do possível, manter-se distanciada delas. Assim, a mente humana torna-se mais sáttvica (equilibrada), conseguindo testemunhar as tendências mais grosseiras sem se deixar dominar. Os impulsos de rajas (energia de vida) são essenciais para a conservação da vida, porém quando excessivos geram enorme inquietação, angústia e senso de competitividade. Assim, agitada, a mente jamais realizará a verdade em si mesma. Os impulsos de tamas (energia de morte) surgem após a mente tomar direcções equivocadas e sofrer por isso. Essa angústia que tamas traz pode significar uma correcção de rota. Pode estar ligada a quebra do orgulho, que permite vislumbrar caminhos diferentes para a vida. Muitas vezes, o próprio despertar para espiritualidade ocorre após um período tamásico de profundo sofrimento. Então, estando enfraquecido, o ego consegue reconhecer que o caminho que vinha seguindo era ruim e que ele não possuía sabedoria. Assim, abre-se para novos conhecimentos e a Misericórdia Divina começa a trazer ensinamentos espirituais das formas mais imprevistas. Humilhado e afundado em tamas, o ego passa a ouvir. Chega um momento em que começa até mesmo a questionar a sua verdadeira identidade, é quando começa o autêntico caminho espiritual. O anseio por realizar o Ser então relega os demais desejos ao segundo plano. A vida ganha um novo sentido. Tudo isso, na maioria das vezes, é precedido por um mergulho no abismo de tamas, mas, se ficarmos lá por muito tempo, podemos ter um destino trágico. Somente a Graça nos resgata e nos faz ver a vida sob uma nova perspectiva. Sem se prender às coisas do mundo, a mente humana está livre para realizar sua Verdade mais profunda. Por isso, não pode ser dominada por energias grosseiras. Precisa se fazer mais quieta e mais silenciosa, até que, sem esforço algum, tudo seja revelado em seu interior. .
E TERÁS QUE ME DIZER: O LIVRO ALÉM DO CLICHÊ ADVAITA
Opinião de: Alsibar Paz (Professor e Psicanalista), autor do livro Lúmina, A Jornada do Despertar
O livro acima citado, de autoria de Jorge Cunha Cruvinel Filho, não é uma obra puramente Advaita Vedanta (não-dualista) como muitos poderiam pensar. Há nele elementos que remetem a todas as grandes filosofias e tradições sagradas da humanidade. É possível perceber ecos do budismo, do misticismo cristão, do taoísmo, de Krishnamurti, UG, do zen e até da psicologia e psiquiatria – como não poderia deixar de ser, visto que é a área de atuação profissional do autor. Escrito em estilo literário, o livro chega a lembrar as grandes obras filosóficas do oriente com sua beleza poética aliada a uma profunda sabedoria. Não é um livro para ser refutado, mas sim degustado. Mas, mesmo que tentasse, seria impossível discordar de suas afirmações, porque elas vão sempre refletir verdades profundas, em algum nível da complexa psiquê humana. O autor trabalha muito mais no campo da filosofia lírica, simbólica, do que, propriamente, religiosa.
Quem fala na obra não é o Jorge, psiquiatra, escritor, buscador, mas sim o “eu lírico” do buscador universal presente na alma de toda humanidade. Durante sua leitura, a mente silencia e a vontade que se tem é de fechar os olhos e apenas ouvi-lo, sentindo suas palavras vibrarem no mais íntimo do ser. Jorge está muito mais para poeta do que para guru — o que faz toda diferença, pois torna sua obra singular e rara. Se usasse um pseudônimo estranho de um guru qualquer da antiguidade, seu texto poderia facilmente se passar por um pergaminho antigo, achado em alguma caverna secreta nos recônditos inacessíveis dos Himalaias ou do Egito.
A obra não tem índice – o que pode parecer estranho. Composta por 60 capítulos e cada capítulo dividido em “versículos”, tem um formato diferente dos livros que normalmente são vendidos no mercado. O livro conta, ainda, com várias ilustrações coloridas de Marcus Knight.
O estilo também é diferente: ele não precisa ser lido em sequência. Em algumas partes, temos a impressão de estarmos andando em uma espiral, pois alguns assuntos são retomados, mas a cada “volta” novos elementos e ângulos são adicionados – uma forma de expandir a compreensão do leitor, motivando-o a ter novas percepções e insights à medida em que avança na leitura. Além disso, o autor consegue fugir do lugar comum das frases feitas tão recorrentes nos discursos de gurus e pretensos mestres neo-advaitas (novos não-dualistas) e apresenta um texto leve, diferente, ao mesmo tempo poético e profundo, o que potencializa o prazer da leitura. A repetição do significado dos termos em sânscrito – rajas, tamas, sattva e karma – poderia ser evitado para que a leitura pudesse fluir melhor. Todavia isso é um detalhe que em nada diminui o valor deste primoroso trabalho.
Apesar de predominantemente poético, o livro de Jorge Cruvinel une com bastante equilíbrio poesia e exatidão. Seu eu lírico tem plena consciência da responsabilidade de não fugir demais da descrição daquilo que é verdadeiro, sob pena de deturpar a Verdade — tão preciosa para aqueles que estão sedentos pelo despertar. É, portanto, ao mesmo tempo uma obra lírica e um guia de orientação para todos que estão mergulhados na selva sombria dos conflitos, vivendo sob o peso do sofrimento psicológico. Por isso, é uma obra para se aprender, mas também para se desfrutar. Está mais do que recomendado e aprovado.
Youtube: Prof. Alsibar Paz
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